Havia uma época em que as casas tinham muros baixos e os jardins eram preenchidos com roseiras coloridas, cheias de vida. As pessoas passavam pelas ruas e podiam ver as flores balançando com a brisa suave, sentir o perfume que se misturava ao ar fresco das manhãs. Aqueles muros baixos eram muito mais do que uma questão de arquitetura; representavam a confiança que existia entre as pessoas, uma confiança tão natural que mal percebíamos o quanto ela era valiosa.
As crianças brincavam nas ruas de pés descalços, sem preocupações. As brincadeiras não precisavam de tecnologia ou grandes artifícios: uma bola, um pião ou até mesmo o simples ato de correr, de uma ponta à outra da rua, enchiam nossos dias de alegria. A rua era a nossa maior aventura, e os amigos, nossos companheiros inseparáveis. Não havia pressa para voltar para casa, porque sabíamos que nossas famílias estavam sempre por perto, observando à distância, enquanto a gente vivia a nossa infância livre.
As cadeiras nas calçadas, então, eram um ritual. Ao fim da tarde, os vizinhos se reuniam na frente das casas, trocando histórias, risadas e conselhos. A vida fluía de forma tranquila e, no fim de cada conversa, sentíamos que pertencíamos a algo maior: uma verdadeira comunidade. Cada pessoa conhecia o nome de quem morava ao lado, sabia da vida, dos sonhos e até dos problemas de cada um. Éramos próximos não só pela distância das casas, mas pelo carinho, pelo respeito e pela solidariedade que se compartilhava.
E quando a chuva chegava? Ah, como era bom! Diferente de hoje, em que corremos para nos abrigar, naquela época a chuva era convite para mais diversão. A gente saía para a rua, pulava nas poças d’água, sentia o frescor das gotas caindo no rosto e corria até não ter mais fôlego. Era uma felicidade sem limites, uma liberdade que só a simplicidade dos dias nos trazia. Nem os pais se preocupavam. Sabiam que, ao final, todos voltariam para casa, encharcados de água e de risos.
Naquela época, mandar um filho até a esquina para comprar pão era a coisa mais natural do mundo. Não havia medo, nem insegurança. O trajeto até a padaria era uma aventura cotidiana, e a volta com o pão quentinho nas mãos era uma pequena vitória, um orgulho infantil. Os pais esperavam na porta, tranquilos, e sabiam que o filho retornaria seguro, com uma história para contar, um sorriso no rosto e o cheirinho do pão recém-saído do forno.
Mas os tempos mudaram, e com eles, a forma como vivemos. Os muros cresceram, as ruas ficaram mais desertas, e os vizinhos, muitas vezes, se tornaram desconhecidos. As cadeiras não ocupam mais as calçadas, e as conversas agora são rápidas, muitas vezes limitadas a uma tela de celular. O medo substituiu a confiança, e a insegurança nos afastou uns dos outros. Mandar uma criança para a esquina, hoje, é motivo de apreensão. E aquele sentimento de liberdade, de pertencimento, parece cada vez mais distante.
O que nos resta são as lembranças. E que lembranças! Elas vêm à tona em momentos como esse, quando vemos uma foto de uma casa de muros baixos, com janelas grandes e um jardim florido, e sentimos um aperto no coração. A nostalgia nos faz perceber que, de fato, éramos felizes e nem sabíamos. Felizes porque tínhamos a liberdade de viver a simplicidade de cada dia, de confiar nas pessoas ao nosso redor, de sentir que o mundo à nossa volta era seguro e acolhedor.
Hoje, entre as paredes mais altas e as portas trancadas, sonhamos com o tempo em que éramos livres, com as risadas das crianças nas ruas e as conversas das calçadas. Sonhamos com os dias em que conhecíamos nossos vizinhos pelo nome e em que a comunidade era uma verdadeira família. Pode ser que esses dias não voltem mais, mas a memória deles continuará viva, nos aquecendo o coração e nos lembrando de que a felicidade, muitas vezes, está nas coisas mais simples da vida.
Comente